AVALIAÇÃO DA QUALIDADE DO ENSINO :
fazendo e aprendendo
Edla M.F. Ramos, Nelcy D.A. Mendonça e Silvia M. Nassar.
Professoras do Departamento de Ciências Estatísticas e da Computação
Centro Tecnológico
Universidade Federal de Santa Catarina
Caixa Postal 0476
88049-Florianópolis-S.C.
1. Introdução
Como toda a sociedade brasileira, a Universidade atravessa uma profunda crise. Esta crise é fundamentalmente uma crise de identidade, que se aguça com a carência econômico/financeira e com a onda de descrédito pela qual a mesma vem atravessando. É durante períodos de crise, que o cuidado e o esforço em tomar decisões acertadas devem ser redobrados. Em função disto, mas principalmente pela grande importância que têm para o desenvolvimento da nação, urge que se estabeleçam processos de avaliação para as instituições de ensino superior.
Uma experiência em avaliação da atividade de ensino, vem ocorrendo no CEC-Departamento de Ciências Estatísticas e da Computação da UFSC-Universidade Federal de Santa Catarina. Este texto pretende relatá-la.
Ao se falar em avaliação é importante e adequado fazer um exercício teórico para definir o ato de avaliar. A definição usual, encontrada nos dicionários da língua portuguesa, é a seguinte: avaliar é dar valor, apreço ou merecimento. Logo, a ação de avaliar se constitui, inicialmente, de uma aferição de acordo com alguma escala de valores pré fixada. Generalizando, pode-se dizer que avaliar é comparar uma "realidade" com um "modelo ideal". Este "modelo ideal" expressaria, através do delineamento de metas e objetivos, um padrão de qualidade a ser atingido.
Numa instituição tão complexa quanto a universidade, estabelecer um padrão de qualidade é tarefa que certamente demandará um grande esforço. Há que se vencer o inevitável confronto decorrente das diversas visões existentes hoje acerca do seu papel (sem o que não haverá a superação da crise de identidade já citada).
O ato de avaliar pode também ser equiparado à realização de um diagnóstico da realidade. Ora, um diagnóstico só estará completo se a "doença", causa dos sintomas, for detectada. É preciso, portanto, conhecer todos os "órgãos do organismo", bem como suas funções. Para avaliar qualquer sistema, é então fundamental, o conhecimento das partes componentes e dos papéis representados pelas mesmas (para que o diagnóstico se complete).
Segundo Isaura Belloni, no âmbito das instituições universitárias brasileiras, "qualquer processo de avaliação assume sua real importância, quando o mesmo se colocar na perspectiva de gerar as transformações necessárias à superação dos equívocos e deficiências existentes". Neste sentido, se o processo de avaliação iniciar nas IFES - Instituições Federais de Ensino Superior, este deverá ser muito mais abrangente do que aqueles imaginados com o objetivo apenas da distribuição das minguadas verbas governamentais, ou visando estritamente a punição/promoção de funcionários e professores. Na verdade estes deverão ser também resultados decorrentes de um tal processo, mas são, com certeza, insuficientes para a superação da crise atual.
Da experiência realizada no CEC em 1990, o principal resultado foi a construção de um paradigma, sob o qual se define uma nova perspectiva: a qualidade da atividade acadêmica é de responsabilidade dos alunos, dos professores e da instituição. É principalmente na interação entre estes três agentes, que esta atividade se processa. No entanto, esta qualidade também é afetada por agentes não pertencentes ao ambiente interno da instituição. O ambiente externo, a sociedade na qual a Universidade se insere, também é responsável, pois também é um agente do processo.
Sob esta perspectiva vislumbram-se quatro abordagens distintas no processo de avaliação das Universidades. Cada um dos quatro eixos na Figura 1, corresponde a uma destas abordagens. Os eixos são os seguintes:
a)Eixo social externo - interação entre a sociedade e a instituição;
b)Eixo social interno - interação entre a instituição e os alunos;
c)Eixo institucional - interação entre os professores e a instituição, e
d)Eixo pedagógico - interação entre os professores e os alunos.
Cada um dos nodos, componentes do diagrama acima, representa um agente no processo. Os mesmos tem papéis a desempenhar. O delineamento destes papéis é requisito para a definição de uma metodologia de avaliação. Ao fazer isto, implicitamente estariam sendo definidas as metas a serem alcançadas, e estas trazem em seu bojo o padrão de qualidade almejado. Como já foi dito, esta não deverá ser uma tarefa simples na atual conjuntura das IFES brasileiras.
Com o objetivo de ilustrar o nível de complexidade da tarefa citada, fêz-se um exercício breve que formula de maneira sintética a relação de papéis a ser atribuída a cada agente. Estes papéis, além de estarem vinculados a um agente específico, estarão também vinculados a um eixo (relação entre dois agentes), donde expressarão a expectativa que cada agente tem em relação ao outro, do mesmo eixo.
Para que se possa ter nitidez no "diagnóstico", é preciso definir exatamente "quem compõe?" e "como se compõe?", cada um dos agentes do processo. Então, esclarecendo, entende-se como: instituição - os órgãos formais da administração da universidade (evidentemente os professores, funcionários e estudantes, por participarem destes órgãos, são também responsáveis pelos papéis atribuídos à mesma); sociedade - seus segmentos organizados e as instituições governamentais; professores - cada profissional do ensino superior no exercício de sua profissão e alunos - cada estudante individualmente.
Eixo Social Externo (Relação Instituição<-->Sociedade)
Segundo este eixo de interação devem ser enfocadas na avaliação tanto as atividade de pesquisa e extensão quanto as de ensino. Evidentemente neste caso o processo de avaliação deve ter uma perspectiva macro, enfocando apenas os resultados globais e terminais do fazer acadêmico, expressos através dos objetivos mais gerais que vislumbram o papel da instituição na sociedade.
Relativamente a este eixo, na atividade de Pesquisa e Extensão é atribuição da:
instituição - a)elaborar e executar projetos científico-técnico e sócio-economicamente relevantes em todos os campos do conhecimento e b)administrar de forma eficiente e produtiva os recursos destinados para este fim;.
sociedade - financiar, valorizar e apoiar projetos, bem como participar da política de elaboração dos mesmos.
Na atividade de Ensino é papel da:
instituição - a)formar profissionais competentes e atualizados, em quantidades adequadas às demandas provenientes da sociedade em que a mesma se insere e b)administrar de forma eficaz os recursos destinados para o ensino;
sociedade - a)financiar e apoiar a atividade de ensino e b)Participar da elaboração de planos curriculares adequados.
Eixo Social Interno (Relação Instituição<-->Alunos)
Sob este eixo a avaliação trata diretamente da atividade do ensino, centrando o foco nas condições dadas aos estudantes para que desenvolvam seu potencial intelectual de forma plena. Chega, neste caso, a atingir até aspectos de assistencialismo da instituição em relação aos seus alunos. Por outro lado o processo deve também avaliar e acompanhar o desempenho do estudante de forma global.
Sob a ótica desta abordagem são papéis:
da instituição - a)agir administrativamente buscando prover os recursos necessários ao desenvolvimento desta atividade e b)subsidiar os estudantes no sentido de lhes garantir condições de vida (saúde, moradia, alimentação ,transporte, etc...) condizentes com um bom desempenho acadêmico;
dos alunos - atuar de forma participativa e responsável visando a obtenção de um bom nível técnico e científico.
Eixo Institucional (Relação Instituição<-->Professores)
O desempenho acadêmico dos professores e principalmente o cumprimento das suas funções estão sob a mira deste eixo. O mesmo aborda todas as atividade dos professores ( ensino, pesquisa e extensão). No tocante a instituição devem ser focalizadas as condições de trabalho dadas aos professores para que os mesmos exerçam adequadamente a sua profissão.
Sob a ótica deste eixo, quanto à atividade de ensino, a avaliação deve enquadrar os aspectos mais formais e institucionais, que perpassam a relação em análise. Neste sentido entendem-se como papéis:
da instituição - a)administrar objetivando fornecer as condições necessárias ao bom desempenho da atividade e b)incentivar a viabilização de programas de formação e atualização para os professores;
dos professores - a)elaborar e cumprir programas e planos de ensino; b)elaborar e executar programas de formação e atualização.
Enfocando a atividade de pesquisa e extensão, é responsabilidade:
da instituição - a)administrar objetivando criar as condições necessárias ao desenvolvimento satisfatório da atividade; b)subsidiar e incentivar programas de atualização e aprimoramento técnico-científico.
dos professores - a)elaborar e executar projetos científico-técnico e sócio-economicamente relevantes e b)formular e desenvolver programas de aperfeiçoamento técnico e científico.
Eixo Pedagógico (Relação Professores<-->Alunos)
O fundamental nesta abordagem é avaliar o que ocorre no ensino com o foco centrado na realidade de cada turma em cada disciplina. O dia a dia da prática pedagógica é que está em foco, tendo-se neste caso uma perspectiva micro da questão. São papéis dos:
professores - a)efetivar uma prática pedagógica eficiente e consoante com princípios psico/pedagógicos atualizados; b)efetivar uma prática pedagógica coerente com a formação de indivíduos autônomos que saibam usar criticamente, com base numa consciência do bem comum, os recursos tecnológicos e os conhecimentos adquiridos e c) ter o domínio dos conhecimentos científicos e técnicos da sua área;
alunos - participar efetivamente do processo de ensino-aprendizagem visando alcançar um bom desempenho acadêmico.
Evidentemente cada um dos eixos da avaliação definido sob esta perspectiva tem características muito peculiares e muitas questões para reflexão (Como se caracteriza um projeto sócio-economicamente relevante na área de pesquisa e extensão? Como identificar uma prática pedagógica eficiente?). Desta forma, não existe, um único momento de avaliação, mas sim múltiplos momentos e múltiplas maneiras de fazê-la. Neste sentido entende-se que devem ser estimuladas iniciativas que proponham metodologias de avaliação segundo todas as abordagens delineadas.
Um outro aspecto importante a ser abordado, diz respeito a quem deve participar das várias fases do processo de avaliação, principalmente da que se refere ao conhecimento e manipulação dos resultados produzidos pelo mesmo. Isaura Belloni enfatiza que uma sistemática de avaliação da atividade acadêmica "diferentemente daquela apropriada a instituições na qual a política interna depende de decisões centralizadas, deve ser desenvolvida a partir dos seguintes princípios...", dentre outros: "todos os segmentos envolvidos devem ter conhecimento dos resultados do processo e devem participar na decisão acerca de sua utilização". Sem o que, o processo não adquiriria a credibilidade necessária à sua efetividade. Considerando que a avaliação deve embasar o processo de tomada de decisões e que numa instituição democrática todos devem tomar parte do processo de decisões, então todos devem ter acesso às informações decorrentes da avaliação.
Por outro lado, são muitos os níveis de tomada de decisões dentro de uma instituição, e os resultados de um processo de avaliação interessam a aqueles que deveriam participar diretamente desse processo. Por exemplo, no caso da avaliação do professor, não cabe a publicação dos resultados em murais de corredores de salas de aula (como tem acontecido, apesar de que tais fatos fossem facilmente justificáveis no contexto em que ocorreram). Já no caso da avaliação da instituição, e das linhas curriculares, caberia a publicação e o debate intensivo, inclusive na imprensa (o que raramente acontece).
Por se tratar de um departamento de ensino o CEC em sua proposta de metodologia de avaliação aborda apenas os eixos institucional e pedagógico, pois os eixos sociais externo e interno saem de sua abrangência. A seguir, será relatado mais detalhadamente como vem se dando a busca de uma metodologia no CEC.
2. Relato da Experiência
O Departamento de Ciências Estatísticas e da Computação é uma das unidades que compõe o Centro Tecnológico da UFSC, tendo sido criado em 1971. Dentre seus objetivos estão o atendimento do ensino e o desenvolvimento da pesquisa e extensão nas áreas de Computação, Estatística e Análise Numérica. Até o ano de 1975 o Departamento ministrava o ensino nas áreas de sua atuação a nível básico nos diversos cursos de graduação da Universidade. No ano 1976 foi criado o Curso de Bacharelado em Ciência da Computação. Em 1987 implantou-se um Curso de Especialização em Ciência da Computação. Está previsto para 1992 sua transformação em mestrado.
O Departamento atende em média, por semestre, 61 disciplinas alocadas em 112 turmas perfazendo um total de 3784 matrículas. Conta, em 1991 com 50 professores (estando 11 afastados), 6 funcionários e 5 monitores.
Em abril de 1989 o Colegiado do Departamento, visando dinamizar o processo de tomada de decisões, decidiu estruturar-se em Câmaras com fins específicos, foram então criadas as câmaras de Administração, Pesquisa, Pós Graduação, Extensão e de Ensino. A Câmara de Ensino (CEns) estabeleceu como prioridade a questão da avaliação do ensino ministrado pelo Departamento e decidiu que a implantação do processo de avaliação se daria a partir de um documento aprovado pelo Colegiado em dezembro de 1987. Foi designada uma comissão de professores que elaboraram um projeto e coordenaram a execução do mesmo.
O resultado oficial apareceu na forma de um relatório que foi aprovado pela CEns em setembro/90, recomendando ao Colegiado a continuação do processo. A necessidade de modificações na metodologia foi sentida a partir de críticas e sugestões de professores e alunos. A partir dessas críticas e dessas sugestões, concluiu-se que modificações profundas eram necessárias, gerando, então, o projeto proposto para 1991.
2.1. O projeto de 1990
O processo de avaliação da qualidade do ensino executado pelo Departamento CEC em 1990, tinha os seguintes objetivos gerais: a)avaliar a qualidade do ensino no CEC para obter subsídios visando a formulação do plano anual de ensino do Departamento e b)definir uma metodologia de avaliação de ensino.
A fim de obter elementos para esta avaliação foi realizada a coleta de dados sobre: o desempenho docente, as disciplinas ministradas pelo CEC, a demanda do ensino e sobre os recursos disponíveis e os necessários.
A metodologia proposta previa que a avaliação da qualidade do ensino seria feita: pelos alunos, pelos professores (auto-avaliação) e por conjuntos de professores agrupados inicialmente em GPDA's-Grupo de Professores de Disciplinas Afins (uma forma ainda incipiente de avaliação pelos pares). Seriam utilizados para a coleta de dados dois tipos de questionários: um para alunos e outro para professores.
O questionário de avaliação pelo aluno foi composto de três partes: avaliação do professor, avaliação da disciplina e auto-avaliação. Cada uma destas partes continha vários ítens aos quais o aluno deveria atribuir nota de zero a dez, em uma folha de respostas. A parte 1 - avaliação do professor - abordou os seguintes aspectos: assiduidade, postura em sala de aula, didática, relacionamento com o aluno e atualização. Continha 26 ítens, sendo que o último solicitou uma nota geral para o professor. A tabela 1 apresenta um trecho desta parte. A parte 2 - avaliação da disciplina - continha 12 ítens, abordando: importância dada à disciplina no curso, adequação da carga horária, bibliografia, sistema de avaliação, disponibilidade dos recursos, preparação recebida nas disciplinas anteriores e o conhecimento adquirido na disciplina. A parte 3 - auto-avaliação - tratava da motivação do aluno para cursar a disciplina, frequência e pontualidade, participação nas aulas e assimilação do conteúdo, em 7 ítens.
TABELA 1 - Trecho do questionário do aluno - Parte 1 - Avaliação do professor. CEC / UFSC / 1990.
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9. Caracterização e destaque dos aspectos importantes da matéria...
10. Estabelecimento de relação entre teoria e prática na disciplina.
11. Adequação do tempo gasto na exposição dos tópicos...............
12. Uso de exemplos e ilustrações ao expor a matéria................
13. Preparação da aula a ser ministrada.............................
14. Estabelecimento de conexão com outras disciplinas do currículo..
15. Atualização quanto aos tópicos abordados........................
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O questionário de avaliação pelo professor também continha três partes: auto-avaliação, avaliação da disciplina e avaliação da turma. Cada uma destas partes enfocava os mesmos aspectos do questionário do aluno, vistos sob a ótica do professor.
Seguindo a metodologia proposta, na segunda quinzena de maio foram aplicados os questionários referentes à avaliação pelos alunos e professores. Participaram do processo 1900 alunos, isto é, 81% dos alunos com frequência suficiente naquele semestre e 39 professores, 100% dos disponíveis para o ensino. Os GPDA's organizaram esquemas em que um professor aplicava os questionários na turma de um colega. A comissão de organização, com a participação de um bolsista, codificou os dados e os encaminhou ao NPD (Núcleo de Processamento de Dados) que emitiu relatórios estatísticos. Nestes relatórios as informações foram agrupadas, enfocando: o professor por turma, a disciplina, o GPDA, as áreas de ensino específicas e o Departamento como um todo.
Para cada um dos níveis mencionados foram obtidas medidas estatísticas descritivas, coeficientes de correlação entre as partes componentes do questionário e também comparação entre as respostas do professor e as dos alunos (Análise de Variância). Esta estratégia de análise estatística foi usada, igualmente, por ítens, por aspectos e por partes que compõem o questionário.
Durante o semestre a CEns coordenou os trabalhos para obter informações sobre demanda e recursos. A avaliação da demanda do ensino foi feita pelos GPDA's e pela CEns, baseados em dados fornecidos pelo NPD, produzindo estatísticas sobre demanda reprimida, real e aproveitada, indicando índices de aprovação, de reprovação e de desistência, de cada turma de todas as disciplinas.
Quanto aos recursos a CEns solicitou a cada GPDA informações relativas a recursos disponíveis e necessários para o ensino, enfocando: recursos humanos (professores, funcionários, bolsistas, monitores, laboratoristas, etc.), recursos financeiros (verbas dotadas, verbas de extensão e pesquisa), equipamentos, material permanente e de consumo,recursos bibliográficos. Baseada nestas informações elaborou um documento indicando quais os recursos considerados necessários pelo Departamento.
Após o término do período letivo os professsores receberam os questionários dos alunos juntamente com os relatórios estatísticos. Ocorreram, então, durante o mês de agosto, reuniões de avaliação nos GPDA's para as quais a CEns encaminhou uma cópia dos relatórios de recursos e de demanda, solicitando que elaborassem dois relatórios: o primeiro sobre a aceitação e realização do processo de avaliação no GPDA e o segundo sobre a qualidade do ensino. Este último deveria abordar as seguintes questões: adequação dos programas e planos de ensino; cumprimento dos planos de ensino; competência docente; condições de infra-estrutura do ensino; demanda do ensino.
No decorrer do mês de setembro a comissão encarregada de coordenar o processo, compilou e encaminhou à CEns um relatório contendo as informações dos relatos dos grupos. Este relatório contém três partes: descrição da demanda do ensino, descrição quantitativa da avaliação pelos discentes e avaliação feita pelos GPDA's. A Câmara de Ensino ao enviar ao Colegiado, propôs alguns encaminhamentos administrativos e sugeriu que o processo de avaliação continuasse, com modificações na metodologia. Em dezembro/90 o Colegiado do CEC aprovou o relatório apresentado pela CEns.
Como resultados, além dos oficialmente constantes no relatório final, outros se revelaram substancialmente importantes e merecem ser destacados. Estes resultados se evidenciam através de alguns fatos ocorridos após o término do processo de avaliação: a) o comentário de alunos sobre mudanças de atitudes de professores, principalmente após o período de aplicação dos questionários; b) o impacto das respostas unânimes de alunos e professores quanto a situação de penúria dos laboratórios de microcomputadores, que permitiu mobilização suficiente para sensibilizar a administração superior da universidade com o problema,fazendo com que esta administração dotasse verbas substanciais para a aquisição de mais equipamentos.
2.2. Críticas ao projeto 90
A proposta de avaliação do ensino feita em 1989 e executada em 1990, apresentou várias deficiências. Apesar disto constituiu-se num momento indispensável para que um novo patamar de maturidade fosse atingido, uma vez que provocou reflexões fecundas em muitos membros do Departamento. Estas reflexões lançaram novas luzes sobre a questão e levaram à formulação de uma nova proposta.
A nova proposta foi concebida em duas etapas. Na primeira efetuou-se uma análise da metodologia anterior, segundo duas abordagens: uma abordagem qualitativa e teórica, via entrevistas com os professores que demontraram mais descontentamento e também via os resultados constantes nos relatórios elaborados pelos GPDA's; e uma abordagem quantitativa, via uma análise estatística dos dados coletados.
Na segunda etapa, de posse dos resultados da análise realizada na etapa anterior, passou-se à concepção e elaboração da nova proposta.
Os relatórios dos GPDA's e as entrevistas com os professores mostraram dois pontos negativos constantes da proposta anterior. O primeiro se refere aos papéis de cada componente do processo de ensino-aprendizagem. Não se tinha clareza sobre o que agora chamamos de eixos, de forma a explicitar onde e como cada categoria participa deste processo. Em decorrência deste fato, ocorreram falhas como:
a) não se atingiu um nível de clareza satisfatório entre os professores quanto aos objetivos (para quê?) da realização do processo de avaliação da qualidade de ensino,sendo que junto aos alunos há quase total desconhecimento destes objetivos;
b) o questionário era muito extenso, continha muitas questões sobre generalidades e abordava de modo indireto questões referentes a aspectos fundamentais do ensino;
c) mesmo com a liberdade de modificar o questionário, os professores não o fizeram e após a aplicação alguns negaram os resultados, alegando a deficiência do instrumento;
d) alguns professores se colocaram de fora do processo de avaliação, adotando a postura de que a avaliação do ensino tinha sido feita pelo aluno,não se colocaram como agentes do processo e sim como avaliados;
e) a decisão de divulgação dos resultados foi polêmica, pois o relatório final continha algumas informações que interessavam especificamente ao Departamento juntamente com outras que seriam de interesse da Comunidade Universitária (principalmente as administrativas).
O segundo ponto negativo foi a falta de definição de qual paradigma educacional estava subjacente ao processo de avaliação. De forma mais ampla, também o conjunto de professores não tem claro qual é sua linha de trabalho. Este fato gera, principalmente, a dificuldade em estabelecer qual é, no entender dos professores do CEC, o padrão de qualidade a ser adotado para o ensino que é ministrado. É preciso, em outras palavras, definir sobre qual paradigma fundamentamos o ato de educar, pois tal definição estará implícita em qualquer proposta de avaliação imaginada. Na análise posterior observou-se que estava implícita a visão mecanicista/empirista/comportamentalista, ou mesmo, apesar das diferenças teóricas, a visão idealista/racionalista do ato de educar. Estas visões foram contestadas indiretamente por vários professores e GPDA's, sendo os seguintes aspectos apontados como os mais desfavoráveis:
a) o processo era todo centrado no professor. Ao professor foi designada toda a responsabilidade pelos resultados do ensino. A Instituição e o educando são questionados minimamente. Como indicadores de tais afirmações apontam-se os seguintes: os alunos tinham o direito de ficar anônimos; pouca ênfase foi dada na busca de identificação das diferenças individuais dos alunos respondentes; a parte referente ao aluno e a disciplina no questionário é mínima; o aluno participa muito pouco do processo, limita-se a responder um questionário;
b) a ênfase na avaliação via aspectos quantitativos. O questionário, apesar de sugerir que o aluno usasse o verso das folhas para comentários, sugestões e críticas, não estimulava respostas discursivas e nenhum fórum de discussão com os alunos foi estabelecido, o que vai de acordo com a linha comportamentalista, na qual só interessam os aspectos que possam ser mensurados objetivamente.
Uma análise estatística foi feita a partir das notas que os alunos atribuiram para os ítens do questionário e também para a importância ou peso de cada item em relação ao contexto de cada parte.
Foram selecionadas turmas de fases e cursos diferentes cujos dados foram submetidos a procedimentos de Análise Fatorial, onde evidenciou-se a inexistência de uma estrutura de fatores tendo a grande maioria dos itens do questionário concentrada no primeiro fator, concluindo-se pela alta correlação entre os itens e recomendando-se o enxugamento do questionário.
Da análise das notas atribuídas à importância dos ítens do questionário ficou evidenciado que tanto os professores quanto os alunos centraram a responsabilidade pela qualidade do ensino na figura do professor, pois foram atribuídas notas mais altas aos ítens que abordavam aspectos exclusivos do comportamento do professor tais como : assiduidade, postura, etc.
2.3. O projeto proposto para 1991
Conforme comentado anteriormente, por se tratar de um Departamento de Ensino, considera-se que a avaliação somente pode se dar sobre os eixos institucional e pedagógico, onde estão as atividades que lhe são inerentes, e que esta avaliação deve ser independente para cada eixo. Assim, foram estabelecidos os seguintes objetivos específicos: a) avaliar, sob uma perspectiva administrativa, as condições,o planejamento e a execução do processo ensino-aprendizagem e b) identificar, sob uma perspectiva pedagógica, acertos e erros no processo ensino-aprendizagem, para motivar professores e alunos a melhorar a qualidade do ensino.
Para que seja possível estabelecer um padrão de qualidade, foi necessário definir sobre qual paradigma de ensino-aprendizagem se daria esta avaliação. Com base nas informações de 1990, ficou estabelecido que o processo poderia se dar sob uma perspectiva construtivista. Acredita-se que esta decisão irá gerar novas polêmicas e resistências, mas que este é um caminho para novas descobertas e obtenção de maior amadurecimento. Esta decisão propicia também o seguinte resultado almejado: os questionários serão curtos, simples, com perguntas abertas e diretas, o que facilitará enormemente a análise dos resultados.
Espera-se com a nova metodologia obter-se maior facilidade na decisão de divulgação dos resultados, uma vez que os dados relativos aos diferentes eixos da atividade de ensino, serão colhidos em momentos distintos. Assim, os resultados do eixo institucional (formal) de avaliação que interessam diretamente à Instituição, deverão ser encaminhados à Pró Reitoria do Ensino, ao Centro Tecnológico, às Coordenadorias dos Cursos interessados e ao Diretório Central dos Estudantes, além do Colegiado do Departamento.
Para este eixo o objetivo estabelecido é: diagnosticar a realidade do ensino no CEC visando obter subsídios para o planejamento das atividades concernentes no âmbito do Departamento. Para atingi-lo, os seguintes aspectos devem ser observados: condições de infra-estrutura (laboratórios, biblioteca, recursos técnico-pedagógicos, equipamentos de secretaria, material de consumo, pessoal técnico de apoio, demanda do ensino, etc.), adequabilidade dos planos de ensino (programa, carga horária, bibliografia), cumprimento dos planos de ensino (frequência do professor, acompanhamento do plano).
No eixo pedagógico de avaliação o objetivo é: diagnosticar a realidade do ensino no CEC, visando identificar acertos e erros inerentes à prática pedagógica, levada a efeito em cada turma. Os aspectos a serem observados são: postura do aluno (gosto em cursar a disciplina, nível de frequência às aulas e relacionamento com os colegas e com o professor), postura do professor (gosto em lecionar a disciplina, adequação da prática pedagógica efetivada, nível de domínio de conhecimentos demonstrado e relacionamento com os alunos), sistemas da avaliação do desempenho dos alunos (adequação dos mesmos e resultados alcançados pelos alunos). A Tabela 2 apresenta um trecho do questionário do aluno.
TABELA 2 - Trechos do questionário do aluno - Eixo Pedagógico - partes referentes ao conhecimento do professor e a motivação para cursar a disciplina. CEC / UFSC / 1991.
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Conhecimento
Você acha que o professor está atualizado?.............(S) (N) (P)
Como você observa isso?_______________________________________
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Motivação
Você está gostando de cursar esta disciplina ? ........(S) (N) (P)
Pontos positivos ________________________________________________
_____________________________________________________________________
Pontos negativos ________________________________________________
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Obs.: As respostas estão representadas por S-sim, N-não, P-parcialmente sim
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Basicamente, as etapas a serem seguidas, na aplicação e análise dos resultados, são as mesmas já descritas no primeiro projeto. Uma decisão importante, relacionada com estas etapas, que ainda não foi tomada pelo Departamento é referente ao sigilo das respostas dos alunos. No projeto anterior o professor só teve acesso aos questionários respondidos pelos alunos após o término do semestre. Está sendo atualmente proposto que o professor avaliado em uma determinada disciplina receba os resultados dos questionários em seguida a sua aplicação, para que possa discutí-los com sua turma. Esta questão é bastante polêmica. Os principais argumentos, levantados a favor de que exista o sigilo (inclusive pela maior parte dos alunos), diz que o aluno fica à vontade para poder dar sugestões ou mesmo criticar seu professor sem que receba represálias por isso. Os que são contrários a esta postura argumentam que o aluno é parte integrante do processo de ensino e tão responsável quanto o professor pela qualidade do mesmo. Neste sentido deve assumir suas críticas e discutí-las com seus professores.
Em função desta decisão há dois caminhos possíveis: se for considerada a hipótese do sigilo, cada professor só receberá os questionários dos alunos após o término do semestre letivo e então discutirá os resultados com seus colegas nos GPDA's; senão, logo após a coleta dos dados, os professores receberão os questionários e poderão discutir com suas turmas as sugestões e críticas que foram feitas, para então levar resultados aos GPDA's.
Como as decisões no âmbito deste eixo são de responsabilidade do Departamento, as informações que comporão o relatório que será encaminhado ao Colegiado pela CEns, a partir dos relatos dos GPDA's, serão de domínio deste.
Cientes de que a avaliação da qualidade do ensino não deve ocorrer só nos momentos de coleta e análise dos dados, devendo ser um processo contínuo e que esteja inserido dentro do processo ensino-aprendizagem. E, considerando o atual estágio da avaliação do ensino no Departamento, está sendo proposto que a Câmara de Ensino do CEC implante um Plano de Avaliação e um Programa de Apoio, os quais deverão ser parte integrante do Processo de Avaliação.
a) Programa de Apoio
O Programa de Apoio visa dar subsídios aos professores de forma a interferir positivamente na qualidade do ensino.
A idéia central é que os professores, à medida que sintam necessidade de modificar (corrigir) sua forma de trabalho, tenham onde buscar subsídios.
Para que isto ocorra, uma alternativa é que a Câmara promova eventos (palestras, mini-cursos, encontros) sobre assuntos relevantes, tais como: didática, recursos audiovisuais, tendências das áreas do Departamento, ou outras que apareçam como necessidade dos professores durante o processo de avaliação.
b) Plano de Avaliação
O termo Plano de Avaliação, em analogia ao Plano de Ensino, deve ser feito semestralmente e retratar o conjunto de ações sobre avaliação a serem efetivadas no período letivo. Este plano deverá ter como objetivo a conscientização do processo ensino-aprendizagem por professores e alunos e deverá ser levado a efeito ao longo do processo de avaliação.
Neste sentido sugere-se as seguintes atividades:
- Seleção e reprodução para os professores de material de assuntos de interesse como linhas pedagógicas, sistema de avaliação, qualidade de ensino, etc.
- Viabilização de palestras com convidados especiais.
- Palestras para professores e alunos.
- Reuniões de professores para discutir a questão da "Avaliação da Qualidade do Ensino", sendo que os professores devem levar estas discussões para a sala de aula.
3. Conclusões
Mais especificamente, a proposta de nova metodologia aqui apresentada pretende dar continuidade ao processo de avaliação da qualidade do ensino do Departamento de Ciências Estatísticas e da Computação da UFSC, visando estabelecer as condições necessárias para que o mesmo se implante de forma definitiva. Tais condições, podem ser resumidas em:
- Credibilidade - compreende basicamente o nível de concordância que os participantes devem demonstrar ter quanto aos objetivos definidos para o processo e quanto à eficácia do mesmo no alcance destes objetivos.
- Operacionalidade - compreende basicamente o nível de viabilização do processo, dadas as condições administrativas e financeiras existentes no Departamento.
- Habitualismo - compreende basicamente a propriedade que o processo deve ter de se realizar periodicamente sem que esforços adicionais de monta sejam empreendidos.
Em função de algumas limitações, alguns aspectos considerados relevantes na avaliação do ensino não foram contemplados nesta proposta. Dentre eles, salientam-se:
-Avaliador externo. Entende-se aqui uma pessoa ou um grupo tecnicamente qualificado, que acompanharia ou mesmo executaria tarefas no processo. Este avaliador, dada a sua imparcialidade, incrementaria a credibilidade do processo. É importante esclarecer que não se está fazendo referência à participação organizada da sociedade, pois por razões já citadas, a proposta de avaliação aqui apresentada exclui os eixos sociais. A forte resistência interna e os parcos recursos financeiros, são as principais causas da exclusão deste componente na proposta.
-Participação dos alunos nas etapas do processo de avaliação. Os alunos tem representação legal nos Colegiados dos Departamentos de Ensino, e no caso do CEC, também em suas Câmaras, tal como na CEns. A não participação efetiva dos alunos nestes fóruns prejudicou o contato desejado e que seria necessário na elaboração desta proposta.
Quanto às questões de sigilo e da prática pedagógica estas são polêmicas e devem ser constantemente reanalisadas e discutidas, principalmente quando se trata de um grupo de professores com formação bastante diferente como é o caso do CEC e da grande quantidade de alunos envolvidos.
Finalizando, já foi dito, mas cabe novamente ressaltar, a proposta aqui apresentada pretendeu unir apenas algumas das muitas peças que compõem o difícil quebra cabeças da avaliação de uma Universidade . As peças aqui reunidas não formam a parte central e mais importante do quebra cabeças (eixo social externo) mas são como todas as outras, peças essenciais e indispensáveis.
4.Bibliografia
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______ . Polêmica: por uma Avaliação Política do Ensino Superior. Ciência & Movimento. Pág 12-4.
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